O cometa – Poema de Gonçalves Dias

Eis nos céus rutilando ígneo cometa!
A imensa cabeleira o espaço alastra,
E o núcleo, como um sol tingido em sangue,
Alvacento luzir verte agoireiro
Sobre a pávida terra.
Poderosos do mundo, grandes, povo,
Dos lábios removei a taça ingente,
Que em vossas festas gira; eis que rutila
O sangüíneo cometa em céus infindos!…
Pobres mortais, – sois vermes!
O Senhor o formou terrível, grande;
Como indócil corcel que morde o freio,
Retinha-o só a mão do Onipotente.
Ao fim lhe disse: – Vai, Senhor dos Mundos,
Senhor do espaço infindo.
E qual louco temido, ardendo em fúria,
Que ao vento solta a coma desgrenhada,
E vai, néscio de si, livre de ferros,
De encontro às duras rochas, – tal progride
O cometa incansável.
Se na marcha veloz encontra um mundo,
O mundo em mil pedaços se converte;
Mil centelhas de luz brilham no espaço
A esmo, como um tronco pelas vagas
Infrenes combatido.
Se junto doutro mundo acaso passa,
Consigo o arrasta e leva transformado;
A cauda portentosa o enlaça e prende,
E o astro vai com ele, como argueiro
Em turbilhão levado.
Como Leviatã perturba os mares,
Ele perturba o espaço; – como a lava,
Ele marcha incessante e sempre; – eterno,
Marcou-lhe largo giro a lei que o rege,
– Às vezes o infinito.
Ele carece então da eternidade!
E aos homens diz – e majestoso e grande
Que jamais o verão; e passa, e longe
Se entranha em céus sem fim, como se perde
Um barco no horizonte!

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