Da importância de ser Fabião – Crônica de Luís Fernando Veríssimo
Acordaram o Luiz Pedro às três da manhã.
— Vem pra cá, rapaz.
— Hein?
— Pula da cama e vem pra cá.
O Luiz Pedro zonzo. Ruídos de festa no telefone. Música. Uma voz de mulher gritando “Com o meu batom não!”.
— Quem fala?
— Te manda pra cá!
— Olha eu…
— Sabe o que que o maluco do Pepe está fazendo? Pintando o… Ó Pepe, fala aqui com o Fabião. Diz pra ele vir pra cá.
Outra voz no telefone:
— Fabião?
— Não eu…
— Quero te informar que acabei de pintar o meu pênis de, deixa ver, ocre provençal. É mole?
— É engano.
— Cê vem pra cá ou não vem? Haroldinho, o Fabião sabe o endereço? Hein? Fala aqui com ele.
— Fabião?
— Não. Meu nome é…
— Sabe o posto de gasolina na esquina da rua do Vavá? É o edifício ao lado. Número, número… Rita. Vem cá. Você não é a Rita? Que número é aqui? Fala aqui com o Fabião. Olha, Fabião, você vai falar com a mulher mais gostosa da festa. Ela vai te dar o endereço. Um beijo, cara. Vem logo.
— Olha, você ligou o número errado, eu…
— Oi.
— Oi, Rita. Eu…
— Eu não sou Rita. Sou Malu. Você quer o número?
— Não, eu estou tentando…
— Posso dizer?
— … dizer que ligaram para o número errado daí!
— Noventa e seis, apartamento 32. Terceiro andar.
— Eu não sou o Fabião.
— Quem é o Fabião?
— Não sei. Eu não sou. Meu nome é Luiz Pedro.
— Certo. Anotou o número? Vem logo, Luiz Pedro. Eu gostei da sua voz.
— Eu… Gostou?
— Hmmm. Estou te esperando.
— Posso falar com o… o Haroldinho?
— Quem?
— O que te passou o telefone.
— Certo. Haroldinho! O Luiz Pedro quer falar contigo. Tchau, Luizinho. Não demora, viu?
Voz do Haroldinho:
— Que história é essa de Luiz Pedro, Fabião?
— Nada, não. Só me diz uma coisa. A rua do Vavá qual é, mesmo?
— Está brincando comigo, Fabião? Vem logo pra cá. E Haroldinho desligou o telefone. Luiz Pedro ficou pensando na cama, com o telefone em cima do peito. Lamentando que sua vida era como era. Lamentando todas as oportunidades que tinham aparecido para mudar sua vida, e que ele tinha deixado escapar. Lamentando o fim do namoro com a Suelen, só porque ela citava trechos inteiros do Paulo Coelho de cor. Lamentando, acima de tudo, não conhecer o Vavá.