A força da lei – Crônica de Moacyr Scliar

“Policiais se disfarçam e vão para a sala de aula.”
Folhateen, 14 dez. 1998

– Preciso falar com o senhor em particular.

O professor de matemática recebeu o pedido com desagrado. Não gostava do rapaz, um aluno relapso e de ar insolente. Mas faltava apenas uma semana para o término das aulas, de modo que resolveu enfrentar o sacrifício. Esperou que o resto da turma saísse, fechou a porta.

– Em que posso ajudar você? – perguntou, no tom mais amável possível.

– O senhor me reprovou – disse o rapaz, e antes que o professor retrucasse, adiantou-se: – Eu sei que não fui bom aluno, que faltei a muitas aulas e que fui mal nas provas. Acontece que não posso ser reprovado.

– Não pode? – O professor, a um tempo divertido e surpreso com aquela cara de pau. – E por que não?

– Porque… – O rapaz olhou para a porta, como a certificar-se de que estava bem fechada. – Bem, porque não sou um aluno comum. Estou matriculado como um aluno comum, frequentei as aulas como um aluno comum, mas não sou um aluno comum.

– Não? E o que você é, então?

– Sou um policial. Um policial disfarçado. Olhou para os lados, de novo:

– Estou aqui como aluno, mas na verdade minha tarefa é investigar uma quadrilha de traficantes. Eles têm um agente aqui na escola, um rapaz desta turma. Ele passou de ano, e eu tenho de passar também, para vigiá-lo.

O professor olhava-o, entre incrédulo e desconfiado.

– E como você prova que é policial?

– Como provo que sou policial?

Abriu a camisa e mostrou uma arma, uma pistola automática.

– Está aí a prova. Esta arma é só a polícia que usa. Sorriu, um sorriso que era tão cúmplice quanto ameaçador. – E o senhor pode acreditar que sei usá-la.

Disso o professor não tinha dúvida. Assim como não tinha dúvida de que estava diante de um problema, talvez o problema mais difícil de sua vida.

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