Tag Archives: Crônica de Carlos Drummond de Andrade

No restaurante – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

– Quero lasanha. Aquele anteprojeto de mulher – quatro anos, no máximo, desabrochando na ultraminissaia – entrou decidido no restaurante. Não precisava de menu, não precisava de mesa, não precisava de nada. Sabia perfeitamente o que queria. Queria lasanha. O pai, que mal acabara de estacionar o carro em uma vaga de milagre, apareceu para… Read More »

Juiz de Paz – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

O juiz de paz chegou cedo ao cartório. Era dia de muito casamento — o santo da folhinha ajudava. Aquele cartório! Feio, desarrumado como todos os cartórios. E por que se casam tantas pessoas no Brasil? Por que estão fazendo sempre a mesma besteira? Não aprendem? O oficial-maior apareceu vinte minutos depois, para desagrado do… Read More »

Três Homens na Estrada – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

O encarregado do posto de lubrificação, sozinho àquela hora, estranhou os vultos que vinham a pé, na estrada. O sol nascia; apenas alguns caminhões passavam, transbordando de legumes. Os três homens caminhavam sem pressa, no leito da rodovia, indiferentes ao risco. Motoristas jogavam-lhes palavrões, sem que eles se importassem. Estavam vestidos de maneira inabitual, um… Read More »

O Outro Marido – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

Era conferente da Alfândega — mas isso não tem importância. Somos todos alguma coisa fora de nós; o eu irredutível nada tem a ver com as classificações profissionais. Pouco importa que nos avaliem pela casca. Por dentro, sentia-se diferente, capaz de mudar sempre, enquanto a situação exterior e familiar não mudava. Nisso está o espinho… Read More »

Lambretismo – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

– Legal — exclamou o lambretista do Posto 6, quando lhe contei que no Bairro de Fátima se fundara a Associação de Lambretistas. — Agora não estamos abandonados em meio à população hostil, sem ninguém que puna pelos nossos direitos. Mas é sindicato, no duro? – Isso também não. É um grêmio recreativo, cultural, assistencial,… Read More »

Os Windsor se Esqueceram – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

Confesso que até hoje pela manhã nutria secreta esperança de ser convidado para o casamento da princesa Margaret Rose, mas a chegada do carteiro, que trouxe apenas o boletim de propaganda da embaixada do Japão, dissipou completamente essa veleidade. Bem que esperei dois meses, dentro da maior discrição, nada confidenciando aos mais íntimos. Os Windsor… Read More »

País sem Binóculos – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

Não sei se também ao leitor, mas a mim costumam telefonar a horas chamadas mortas (horas, pelo contrário, em que se sente respirar até a fibra da madeira) para dizer alguma coisa que não é comigo. Em geral, chamam pelo Nosso Bar. Há sempre, na noite, uma pessoa querendo comunicar-se desesperadamente com o Nosso Bar.… Read More »

Doce Conversa Noturna – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

Meu aplauso ao dr. Promotor de Justiça, que, contrariando a índole punitiva de sua classe, se recusou a contribuir para que um casal fosse parar na cadeia pelo simples fato de conversar em casa, de madrugada, em trajes de dormir. Do ato desse representante do Ministério Público se conclui afortunadamente que em nosso país bater… Read More »

Sonho de uma Noite de Abril – Crônica de Carlos Drummond de Andrade

Penumbra. Escritório. Homem, com as mãos à cabeça, fuma e pensa na vida. Alto-falante: – Já fez sua declaração de imposto de renda? – Que renda? Que declaração? Recebi, gastei, estou sem nenhum. – Prepara tua declaração de imposto de renda! – Mas… – Até 30 de abril, improrrogavelmente! Batem à porta. Homem vai abrir.… Read More »