Ao correr da máquina – Crônica de Clarice Lispector

Meu Deus, como o amor impede a morte! Não sei o que estou querendo dizer com isso: confio na minha incompreensão, que tem me dado vida instintiva e intuitiva, enquanto que a chamada compreensão é tão limitada. Perdi amigos. Não entendo a morte. Mas não tenho medo de morrer. Vai ser um descanso: um berço … Ler mais

Daqui a 25 anos – Crônica de Clarice Lispector

Perguntaram-me uma vez se eu saberia calcular o Brasil daqui a 25 anos. Nem daqui a 25 minutos, quanto mais 25 anos. Mas a impressão-desejo é a de que num futuro não muito remoto talvez compreendamos que os movimentos caóticos atuais já eram os primeiros passos afinando-se e orquestrando-se para uma situação econômica mais digna … Ler mais

Amor imorredouro – Clarice Lispector

Ainda continuo um pouco sem jeito na minha nova função daquilo que não se pode chamar propriamente de crônica. E, além de ser neófita no assunto, também o sou em matéria de escrever para ganhar dinheiro. Já trabalhei na imprensa como profissional, sem assinar. Assinando, porém, fico automaticamente mais pessoal. E sinto-me um pouco como … Ler mais

A quinta história – Clarice Lispector

Esta história poderia chamar-se “As Estátuas”. Outro nome possível é “O Assassinato”. E também “Como Matar Baratas”. Farei então pelo menos três histórias, verdadeiras, porque nenhuma delas mente a outra. Embora uma única, seriam mil e uma, se mil e uma noites me dessem. A primeira, “Como Matar Baratas”, começa assim: queixei-me de baratas. Uma … Ler mais

Mais dois bêbados – Conto de Clarice Lispector

Surpreendi- me. não é que abusava de minha boa vontade? Por que mantinha ele um ar de tão denso mistério? Podia contar seus segredos sem receio de qualquer julgamento. Meu estado de embriaguez me inclinava especialmente à benevolência e além disso, afinal, ele não passava de um estranho qualquer…Porque não falava ele de sua vida … Ler mais

Declaração de amor – Crônica de Clarice Lispector

Esta é uma declaração de amor: amo a língua portuguesa. Ela não é fácil. Não é maleável. E, como não foi profundamente trabalhada pelo pensamento, a sua tendência é a de não ter sutilezas e de reagir às vezes com um verdadeiro pontapé contra os que temerariamente ousam transformá-la numa linguagem de sentimento e de … Ler mais

Perdoando Deus – Clarice Lispector

Eu ia andando pela avenida Copacabana e olhava distraída edifícios, nesga de mar, pessoas, sem pensar em nada. Ainda não percebera que na verdade não estava distraída, estava era de uma atenção sem esforço, estava sendo uma coisa muito rara: livre. Via tudo, e à toa. Pouco a pouco é que fui percebendo que estava … Ler mais

Viagem a Petrópolis – Conto de Clarice Lispector

Era uma velha sequinha que, doce e obstinada, não parecia compreender que estava só no mundo. Os olhos lacrimejavam sempre, as mãos repousavam sobre o vestido preto e opaco, velho documento de sua vida. No tecido já endurecido encontravam-se pequenas crostas de pão coladas pela baba que lhe ressurgia agora em lembrança do berço. Lá … Ler mais

Um ser livre – Crônica de Clarice Lispector

Não me lembro bem se é em Les données immédiates de la FonsFienFe que Bergson fala do grande artista que seria aquele que tivesse, não só um, mas todos os sentidos libertos do utilitarismo. O pintor tem mais ou menos liberto o sentido da visão, o músico o sentido da audição. Mas aquele que estivesse … Ler mais

Maria Chorando ao Telefone – Crônica de Clarice Lispector

O telefone toca aqui em casa, atendo, uma voz de mulher estranhíssima pergunta por mim, e antes que eu tome providências para dizer que é minha irmã que fala, ela me diz: é você mesma. O jeito foi eu ficar sendo eu própria. Mas… ela chorava? ou o quê? Pois a voz era claramente de … Ler mais